Tecnologia / No Brasil, quem atua com fundos de investimentos deve seguir as regras estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia responsável por disciplinar e fiscalizar os instrumentos financeiros emitidos por empresas, governos ou outras entidades com o objetivo de captar recursos.
Em dezembro de 2022, a CVM publicou a Resolução 175, que trata de normas para a constituição, o funcionamento e a divulgação de informações dos fundos de investimentos (aplicação coletiva de recursos, ou seja, quando se investe em conjunto com outros investidores).
Como explica a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), a resolução substitui a instrução CVM 555 e outras normas, simplificando o arcabouço regulatório e, com isso, diminuindo o espaço para divergências de interpretação.
Tulio Bock, executivo de vendas sênior da iDtrust (empresa especializada em tecnologia para operações com recebíveis), faz uma análise no mesmo sentido.
“As mudanças trazidas pela resolução visam modernizar o mercado de fundos de investimentos, tornando-o mais atrativo, seguro e eficiente para todos os envolvidos. Para as empresas, isso significa mais oportunidades de captação de recursos e maior confiança por parte dos investidores”, diz.
Bock afirma que a resolução facilitou a criação de fundos em condomínio financeiro, o que permite estruturas mais ágeis e menos burocráticas para os investimentos. A gestão dos fundos passou a ser feita por meio de cotas, o que torna mais transparente a distribuição de resultados entre os participantes.
“Foram estabelecidas regras mais claras sobre as responsabilidades dos administradores e gestores, com foco em boas práticas de governança. A resolução exige também que os fundos divulguem informações detalhadas e periódicas sobre seu desempenho e riscos, garantindo maior clareza para os investidores”, explica.
Medidas como políticas de conflito de interesse e práticas de compliance mais rigorosas foram implementadas para proteger os investidores, acrescenta. Outra diferença pode ser percebida na flexibilidade na alocação: os fundos agora têm mais liberdade para diversificar seus investimentos, incluindo a possibilidade de alocar recursos em ativos internacionais.
Desafios
“A resolução também trouxe ajustes no regime de tributação, buscando simplificar e tornar mais eficiente a cobrança de impostos sobre os fundos”, afirma Bock. No entanto, a adaptação às novas exigências de transparência e governança da Resolução CVM 175 não é uma tarefa simples para as empresas, pondera o executivo.
Segundo ele, um dos primeiros desafios é a necessidade de implementar sistemas e processos mais robustos. Muitas organizações terão que investir em tecnologia da informação (TI) e em ferramentas de gestão para atender às demandas de relatórios detalhados e transparentes.
“Isso pode envolver desde a atualização de softwares até a contratação de consultorias especializadas, o que, naturalmente, gera custos adicionais. Para empresas menores, esses gastos podem ser um obstáculo”, diz Bock.
A capacitação das equipes internas também é vista por ele como essencial. Os gestores e administradores precisam estar bem preparados para entender e aplicar as novas regras, o que exige treinamento e, em muitos casos, uma mudança de mentalidade.
“A resolução aumenta a complexidade na documentação, já que as empresas precisam produzir relatórios periódicos e detalhados sobre desempenho e riscos. Isso demanda processos internos mais organizados e eficientes, o que pode sobrecarregar equipes que já estão com agendas apertadas”, alerta.
Na visão do executivo, há ainda uma pressão adicional sobre os gestores. Com mais informações disponíveis ao mercado, os investidores tendem a cobrar resultados consistentes e justificativas claras para as estratégias adotadas, aponta.
Além disso, as regras podem levar a uma revisão dos critérios de seleção de ativos. Diante de limites mais rígidos para a concentração, os gestores precisam ser mais criteriosos na escolha de investimentos, priorizando ativos que ofereçam um equilíbrio entre risco e retorno.
Responsabilidade limitada das cotas
Para explicar como funciona a responsabilidade limitada das cotas, Bock cita um exemplo hipotético.
“Imagine que você é um investidor, colocando seu dinheiro em um fundo de investimento. Antes da Resolução CVM 175, se algo desse errado, você poderia ser responsabilizado por dívidas ou prejuízos que ultrapassassem o valor das cotas. Essa era uma preocupação real para muitos investidores, especialmente os menores, que não queriam correr o risco de perder mais do que haviam aplicado”, exemplifica.
“Agora, com a responsabilidade limitada dos cotistas, isso mudou. A resolução protege o investidor, garantindo que a responsabilidade se limite ao valor das cotas. Se o fundo tiver problemas, ele não precisará tirar dinheiro do próprio bolso para cobrir dívidas”, complementa Bock.
O executivo diz que, no fim das contas, a Resolução 175 cria um ambiente mais seguro e transparente para todos. Os investidores ganham proteção, os gestores são incentivados a adotar práticas mais profissionais e as empresas podem se beneficiar de um mercado mais estável e confiável.
“É um passo importante para fortalecer o mercado de fundos de investimentos no Brasil, trazendo mais equilíbrio e oportunidades”, conclui.